sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

fim do dia


Eu vejo geometrias fractais se desenharem fluidas nos meus olhos fechados banhados de luz;
Eu vejo poesias se delinerem antropomorfas dentro do ônibus salpicado de gente;
E os anjos da Cateral congelados e suspensos sutis como se leves fossem; talvez orgânicos;
Eu vejo os carros deslizando num asfalto dourado de sol-se-pondo,
Carros imersos em pressa,
Pressa atrasada que aparece nos últimos minutos mais próximos de qualquer fim,

Eu vejo mais um fim de mais um dia,
que se releva no sol que se põe, no trânsito que se acumula,
numa cabeça que pende pesada sobre uma mão apoiada na janela de um carro;

Vejo fins de dias no limiar da escuridão,
Eu vejo gente com sede de casa.

E não compreendo o que isso tudo me tem a dizer,
Mas eu vejo uma senhora indigente postada de pé em frente ao clamado Congresso,
acompanhada de suas prováveis velhas malas, debaixo de camadas coloridas e aleatórias de panos em forma de roupas, atemporal feito só ela, fitando o contra-fluxo de tudo que volta pra casa como se, ali daquele jeito, tragrasse um vazio lindo de coisa qualquer que tenha ares de saudade, de casa, de lar. Talvez seus pensamentos ajam loucos debaixo daquele amontoado de roupa, mas com o semblante sereno e atemporal, a senhora se fazia existir.
Fato que me recordou de um dia. Dia em que tudo que me atingia no meu passar cotidiano tentava me comunicar mensagens infindas; pessoas cheias de intenções e trejeitos, vozes altivas e barbas bem-feitas, maquiagens retocadas, tímidas e desleixadas vaidades, tudo salpicado de intenção, Mal me davam o tempo ou a proeza de pensar, ou, quão menos, apreciar coisa qualquer; a apreciação vinha antecipada em forma de pretensão, e tudo fazia uma lógica perfeita. Urbana, moderna, blasè. Foi ali, num intervalo silencioso: um mendigo se aproximou e desatou a apresentar-se em verborragias circulares completamente ilógicas. Da língua portuguesa, veja bem, nada destilei. Mas o que vi nos olhos dele foi um vazio de pretensão, um vazio azul e profundo feito oceano e pela primeira vez, já no findar do dia tal, tive vontade de sorrir. Não por comicidade ou verdadeiro humor, mas por uma isenção profunda e azul como os olhos deles se-me-mostravam. Era crueza. Ele se ia sendo quase sem finalidade, pois foi quando fez reverência e saiu andando me deixando apenas sua mensagem de dicção embaralhada. Foi crueza... Que daquele velho mendigo saía em forma de olhar e que em mim se esboçou em sorriso

lígia


Era noite de um feriado anunciado e eu não parava de escutar uma composição linda chamada Lígia, de Tom Jobim. Um Jazz impecável, ou seria Bossa? Uma músia, de qualquer forma, cujo vocal era interpretado pela recém chegada em minha vida, Rosa Passos. Eu não tinha pretensões, estava inebriada num daqueles vícios instantâneos que chegam no primeiro ouvir de uma nota, sabe? Sendo assim, O que fazer? Escutá-la, pois!; enquanto ainda me fosse encanto imenso - e ainda é. 

Gostaria de admitir que , aquele momento, queria que ele fosse poético. Beem, poético. Queria forjar poesias com a essência dele. Digo, aquela cena da minha pessoa sentada na escrivaninha com os fones imensos de ouvido querendo me diluir nalgum lugar que não fosse mais eu...

O seu nome
eu não sei
Esqueci no piano
as bobagens de amor...

E num desejo grande de que essa minha confissão me fosse útil, ou lhes acrescentasse algo, forjei cenas e filmes inteiros. Posso dizer, sim, lhes confesso que no fundo da minha taça de vinho modelada em cerâmica meus anos de meninice me foram anulados e ficou apenas aquele ar etílico das coisas perdidas. E eu almejava poesia nisso tudo, almejava beleza em meu pranto mimado, apegado e cego. Mas nada fora útil, e não altera-lhes a cognição muito menos. Sei que eu choraaava. E bebia vinho numa caneca enquanto chorava e lia um livro de amor e continuava com aquela música, cíclica... Enquanto se fazia madrugada e eu desejava ser um ato ritimado e digno de ilíadas, mas não era. E eu continuava achando lindo e desejando que fosse lírico, que fosse filme, que fosse arte. E não era, e não foi, só eu vi. Era a vida, e eu chorava e achava lindo, lindo lindo....

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

resenha de alguma e qualquer percepção desapurada



estranhos num café

Talvez só estivesse sozinho demais para querer ficar sentado com a cadeira da frente vazia e a outra metade da mesa limpa; Talvez um isqueiro como pretexto fosse suficiente para espantar a solidão à potencial companhia daquela estranha mulher na casa de seus quarenta e poucos anos, quase cinquenta. Ela, igualmente só. Sentada à sua frente. Ambos próximos e desconhecidamente familiares naquela varandinha essencial, apertada, porém essencial. Ela usava seu par provavelmente preferido de oxfords clássicos, bico fino, salto número cinco. 

Deu-se o tempo da percepção. Ambos fumavam, ainda recolhidos cada um em sua mesa, conscientes de uma ligação mútua. Foi ele quem tomou a iniciativa, depois de ela muito fugir, cheia de charme, dos olhares furtivos e frequentes que ele passou a lançar.

Acenou com o queixo em direção ao isqueiro que ela segurava ludicamente na mão. Sorriu, evidenciou, entre os dedos, um cigarro novo em folha que esperava resposta. Agora foi, ela pensou. O isqueiro veio ao encontro dele. Foi como se nele estivesse contido um novo convite, "Então, sentaí, acho que já entendi minha imagem praticamente pregada à sua retina. Tô sozinha também, vai, senta". Ou talvez o pedido pelo isqueiro já soasse exatamente como uma pergunta de quem se convida para sentar. Assim foi, ele se sentou. Não precisaram de muitas palavras, fluiu, pá pow, sutil e suave, preencheram a metade da mesa que lhes faltava, limpa, agora, suja. Cheia de papeizinhos amassados, palitos de dente e saches de sal ou açúcar ansiosamente destroçados. Essas coisas corriqueiras, entre assuntos corriqueiros, importantes, de gente grande. É assim, vê? A alma humana.


Vividos, os dois, era bem notável; cansados, sozinhos. Ao menos naquele instante, naquela mesa; convite mudo, guerra fria, desejo mútuo, Café com Letras. Bebiam cerveja, no entanto. Talvez se conhecessem de vista, de frequência, vá saber; de qualquer forma, era a primeira vez de uma colisão efetiva. Reação química, temperatura em ascensão.

Penso assim, talvez não fosse solidão apenas, 
talvez um fosse realmente valioso para o outro, 
talvez aquele contato fosse premeditado, esperado há dias;
ou talvez fossem mesmo suas primeiras ou últimas opções de sexta-feira,
abstinência prestes a ser quebrada; 
na hora, no lugar e nas pretensões certas, perfeitamente cabiam um ao outro.


Atração irremediável, insasiável, não tão mais física, mas ainda sedenta.
Nada que não o corpo do outro grudado,
nada como aquele belo par de oxfords jogados à esmo e às pressas, 
ou cuidadosamente descalçados, 
com direito a carinhos e beijos lentos;
ou desejo apressado, maduro, sexo cru,
obscenidades verbalizadas, dessas  ensaiadas 
e ditas durante anos de experiência.
 . 
Clássicos oxfords preto e branco à esmo pelo carpete, 
ansiosos, sedentos, esquecidos. 
Desejo. Preenchimento.

                                                                          É, era isso: 
Em qualquer caso, companhia, abstinência ou Café: 
Preenchimento.

sábado, 26 de novembro de 2011

resquícios oníricos sobre a chuva, o ser, o contraste & o universo


Esse texto me veio de uma forma inusitada e curiosa. E todas as repercursões deste nos dias que seguiram à noite em que ele submergiu do insciente e brincou comigo foram igualmente curiosas. Ou melhor, e mais, audaciosas.

   Era dia de buscar a irmã mais velha na escola, tardeando dourado. Sexta-feira. Ritual tanto quanto rotineiro o fato de a mãe a requisitar para isso. Saiu, então, em busca da irmã enquanto a mãe esperava na portaria. Ela adorava, aventurava-se, desbravava a arquitetura improvisada daquele lugar, cheio de rampas, escadas e paredes inusitadas... seguia. Corria. Forjava contos de fadas.
     Durante seu trajeto viu portas de uma das salas entreabertas, portas duplas, luzes acesas. Portas verdes de metal cujas clarabóias delineavam circunferências que sempre lhe causaram curiosidade, pareciam pertencer a grandes portais ou paredes de um submarino. Foi até a abertura e espiou para dentro da sala. As carteiras pareciam ter sido achatadas nos degraus, estes que compunham a arquitetura não tão funcional do lugar em forma de arena. Quase a adentrar o recinto, advinhou a silhueta de uma pessoa sozinha dentro da sala. Era um homem de pé em frente ao quadro;  fitava-o pensativo, concentrado. Homem cujos ares e trajes intelectuais remetiam a um professor. E, no presente contexto, era até meio óbvio, mesmo para uma garotinha. Eles perceberam um ao outro, por fim. Ela tinha uns seis anos, ele, quase quarenta.
   
  - Oi... ?
Ele se dirigiu, solene, movendo somente a cabeça.
    - Oi....
Respondeu, tímida. Educada, ainda.

     Ela se aproximou, queria ver o que ele fazia naquele quadro brilhante e luminoso - sua curiosidade a movia quase sem escrúpulos, era sincera. Era criança. - Tinham planetas desenhados, embora não muito reais. Ela reconheceu o que esboçava um sistema solar, e tinha certeza, pois tinha visto na TV.
     - Você é um professor?
     Fez que sim com a cabeça e meio sorriso nos lábios. Olhos sempre atenciosos, era assim que se dirigiam a terceiros: quase sempre muito atenciosos. Embora, diziam por aí, não fosse muito chegado em crianças.
    - Sou sim...
    A garota olhou pro quadro:
    - Você da aula de universo?
   Ele achou graça, 'de universo'? e, de lábios ainda meio esticados:
    - Sim, às vezes ensino coisas sobre o universo.

    A menina se aproximou ainda mais, o encarou e percebeu curiosos óculos que pareciam de brinquedo: tinham lentes amareladas. Se precipitou, oscilando cautelosa sobre suas pequenas pernas:
    - Posso ver seus óculos?
     A curiosidade pura, quando condensa, é difícil de freiar: impossível negá-la o prazer da descoberta.
    Por isso, o professor despiu-os.
     - Cuidado, hein!?  - Advertiu, projetando-se gentilmente. Eram preciosos, pois, aquele par de lentes. Tornavam o mundo possível, nítido, que é como a realidade cotidiana e funcional demanda ser vista.
     
     Ela os posicionou na altura dos olhos, ansiosa pelo que revelariam. Sentiu uma pontada de desconforto por detrás da divergência deles; eram janelas imponentes, fortes e precisas. E brincou um pouco com a luz que por ali passava, quase a esquecer-se da presença do professor.
     
     - Parece... parece quando a gente olha através do vidro do carro quando chove e faz sol ao mesmo tempo.... mas... mas, cadê os pingos de chuva?... - Sussurava pra si, brincando com a própria imaginação em devaneio criativo.
     Ele não entendeu, mas intrigou-se ainda mais. Ela, por sua vez, parou de falar quando se deparou com o olhar nu do professor fitá-la à espera. Era um grande homem aquele se que postava próximo dela, embora ela desconhecesse esses valores e atribuições. O professor tinha voz altiva, bonita, a dicção limpa e uma oratória de dar inveja em muitos pseudo-lobbistas ou políticos. Era adorado por uma imensa maioria de seus alunos. Toda vez que se postava de frente a uma turma de pré-vestibulandos famintos, arrebatava dois ou três corações. Por vez! Bastava que desatasse a falar, ensinar aquilo que sabia Muito, sabia Bem e, o mais interessante, aquilo que ensinava como poucos. Proporcionava conhecimento & entendimento claros, tudo numa tacada só. Brilhante. Enfim, de qualquer forma, pouco importava, aquele profissional a menina não conhecia. O que desfrutou foi a confiança que sentia na companhia dele, e era inegável. Havia algo, algo profundo. Escondido. Para ela, tudo beirava o fascínio, tudo era pretexto para descobertas. Ainda era coringa no mundo, e ele tinha fendas nos lábios que lhe esboçavam sorriso de um. Foi quando, com os óculos dele ainda em mãos, se deparou com o par de olhos que, mais afundo, no demorar do olhar, se revelavam, isentos das vestes; onde algo sobre ele próprio também o fazia. Eram olhos tanto quanto fatigados, nitidamente sensíveis. Pareciam cansados, doentes, frágeis. Detentos de uma delicadeza orgânica e bela. Era isso. Que é que tanto leram? Será que foi de tanto olhar para as estrelas? Por eles tantas coisas devem ter perpassado... Que a aconteceu a esse par de retinas? E, naquele momento, pareciam chover em si, para dentro de si. Ela achou graça, estavam aguados.
     
     - Parece que tá chovendo aí dentro. - Apontou-os.
     
     Ele entendeu a direção dos dedinhos da criança e contraiu as pálpebras. Se por impulso reativo à afirmação da garotinha ou sabe-lá-o-que, atou-os. Versou-os na metáfora imperfeita na qual acabavam de ser enquadrados e sentiu-se abstrato e ilógico uma vez depois de muito tempo. A Física fez-se mais contemporânea e quântica que horas antes, diante de uma plateia infinitamente menor do que havia se acostumado. Diante de um vislumbrar de si muito mais profundo, deixava que os pilares do ego se dissolvessem num ato de delicadeza e auto-conhecimento. Num ato de cansaço. A tempestade desatou em transbordar olhos afora, não era choro nem pranto, era a alma, viva. Muito natural, para ele, que a presença de seus globos oculares se fizesse sentir. Foram, desde muito, uma parte do corpo da qual se lembrava todas as manhãs; um par de órgãos tanto quanto pesados em sua existência. Ali, latejavam cada vez mais,  vivos, fortes e leves, porém. Leves diante daquele ser curioso que postava-se puro, atento, que presenciava algo que pouco compreendia. - Não sabia mais se era a menina ou alguma parte de si mesmo a quem se referia, a quem chamava de 'ser'. Não importava muito, veja bem.

     - Professor? Prof... ? - Doce, a incompreensão do que ocorria causava na menina preocupação e cautela. Por que ele tava a tanto tempo de olhos fechados? Silencioso...?  Pigarreou para que ele despertasse. Estendeu delicadamente as lentes em direção às mãos dele, que estendeu solene as suas, em resposta à devolução. A garota sorriu. Ufa, pensou, não ficou chateado comigo por ter pegado os óculos dele e falado da chuva ou....

     - Professor? - A curiosidade lhe arrematava novamente. - Posso fazer uma pergunta?
     - Claro, diga. - Sorriu de novo. In
     - É que... é que eu queria saber, se... chove no universo, professor?

     Se chove no universo? Ele repetiu com seus botões. Água? Impossível... ! Condensação de água na ausência da via láctea.. impossível... meteoritos, talvez... Mas, chuva? Chuva terrena? H2O... Algo nele impediu-o de dizer isto, porém. E o impulsionou numa direção inusitada:

    - Sim, há chuva no universo... E sabe por que?

     Ela respondeu com os olhos, que davam passagem para que ele continuasse. Ele ajoelhou-se diante dela. Seus olhares se encontravam numa mesma linha de horizonte. E, na dicção didática de sempre, falou:

     - Lá chove muito de vezenquando, desatam temporais. Que é para limpar os corpos celestes, pois assim eles se mantém leves e suspensos.

     O professor pensou na gravidade... corpo, massa, atração; era por isso que se mantinham "suspensos". Não tinha nada a ver com limpeza, leveza ou chuva! Pensou noutra gravidade: a da mentira que havia acabado de revelar. Por que diabos tinha dito aquilo??? Um palpitar mudou o curso de seus pensamentos novamente: Mentira? Equívoco? Imaginação? Certamente alguém um dia iria ensinar àquela menina “a verdade”. Um dia, quando fosse tempo para isso. Quem sabe ela mesma não comporia uma de suas cheias classes pré-vestibulandas, e estudaria sobre o modo cartesiano de ver muitas das coisas? De qualquer forma, esse dia não era aquele. Não agora. Nem ele, por minutos, nem ele mais faria do próprio tempo presente o momento em que veria as coisas lineares e, por mais um lapso, quis e, quase 'de fato', acreditou no que tinha acabado de dizer. Por todos os anos de estudo, por todo conhecimento e genialidade, por toda didática e dialética, desconstruiu-se permitindo-se o equívoco do erro. Ou melhor, da imaginação. Forjou-se leveza, ingenuidade. Fascinado, pois. Sentiu fascínio pela pergunta criativa da menina, sincera e despretensiosoa: pelo imenso lirismo que cabia nela. Sabia muita coisa relacionada aos registros e estudos científicos sobre o universo. Não obstante, compartilhou sua mais nova teoria acerca de uma suposta chuva na via láctea... Que loucura! Ria consigo na consciência da volatilidade daquele momento. Olhou pras pantufas e quis desfazer-se delas também - só um pouquinho. 
     
     Quis despir-se em alma. Resgatar algo do qual pouco se deixava ser de tanto vestir um personagem. Este forjado não apenas como forma de entretenimento de terceiros, mas de carisma e auto-proteção. Tirou os óculos novamente. Sem o filtro destes, o mundo disforme pareceu mais natural e confortável. A abstração do que via o remetia a sensações antigas, puras. De algum jeito... de alguma forma... aquilo tudo.... a ingenuidade, o resgate, a saudade, o despertar, a novidade... o mundo, e também, o amor. O universo numa casca de nóz. Sentiu-se a própria casca, em expansão, em ausência, em vazio, todo composto por corpos brilhantes, por energia, luz, relatividade, gravidade e, acima de tudo, temporais. Em algum lugar, encharcado da tempestade que se revelava através dos olhos míopes, um buraco negro não deixava escapar nada que ousasse passar por perto. Nada que não possuísse a crueza e a 'leveza insustentável de Ser'. 'Ser' isento de cultura, de valores e de tempo. A crua casca dilatava-se, rasgando todas as camadas de pele e representatividades. E chovia. Choviam dilúvios. Em algum lugar, de algum jeito, de alguma forma não cartesiana, não catalogada, mestrada ou diagnosticada, em algum ponto anti-principal de si, algo se essencial se diluía e desconstruía em temporais.


- Às vezes.... sim,
repetiu em silêncio,
às vezes chove no universo.



sexta-feira, 23 de setembro de 2011

me devolve esse sorriso ?


É que naquele ato de graça mór nossa sincronia se fez audível em forma de humor compartilhado;
ela deu um riso de uma raíz tão profunda e audaz que da minha boca todo o meu foi roubado. 
Furtiva e risonha ela flui pra fora de si, desaguou orgânica na própria pele e o ato se concretizou: cada milímetro de contração muscular no qual eu pudesse esboçar um sorriso fez-se ausente. 
Volátil, inodoro.
Ela sorriu por mim, eis o que sucedeu.
E eu, de olhos preguiçosos tragados por aquele sorriso duplo, não clamei para que me devolvesse… deixei que partezinha de mim continuasse pertencendo a ela; gozo esboçado em lábios alheios e esticados, dentes e partezinha da alma escancarados.
Encantei-me, permaneci.

Olhos estáticos. Corpo esquecido. Algum resquício de graça forçando o canto da boca entreaberta. Nada de riso. Os olhos talvez sorrissem, e muito, enquanto viam oscilar nas sinapses contrativas daquele tecido muscular o meu sorriso roubado atado ao dela, 

meio mágico. É... meio sufocante e mágico.

Retomei meu chão ou parte dele. Meu lábios colados nos dela dançavam contorcidos de humor;
Retomei algo a mais, uma lucidez suficiente para que uma ideia desabrochasse e me preenchesse,
foi inundando,
foi passando, o tempo, esse tempo...
e ideia tal que a mente teimou parasitar, ficou, sem findar, e cresceu:
Como daquele sorriso retomar posse
(ecoava, pretensiosa)
se um beijo eu NÃO roubar? 
(instigava, querendo ser)
pois bem .

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

EU AMO PORQUESIM


Tá bom, disse, vou subverter! Não vou deixar de amar mais! Não vou ficar nessa tentativa doentia de forçar esquecer. Que coisa é essa de que o amor é aniquilável assim? Por isso dói, durrr! Vou subverter aprendendo que amar não se resume a...


amar não se resume.


A essa ideia fraca de amor aliado à posse. Presença. Me deixa amar como tem que ser... sendo feliz de longe, comigo! Amar não é pensar no ser amado todos os dias, a todo o tempo. Nem escrever ilíadas das mais românticas, serenata na janela, nome na areia. Isso é cultura. Quero amar me perdoando da ousadia de isentar a cultura da palavra. Amor sendo inteiro distante. Amar não é dividir, seiláqueporra é amar... Sei que não é dividir. E vou continuar... decidi, vou continuar amando por ser, amando por amar. Amar por existir, por compartilhar, por sentir carinho. Por gostar. Amar por ter compartilhado, amar pelas lembranças, pela intimidade cedida. Mesmo que não mais. Se o encontro foi descartável, que se foda o encontro, que se foda quem foi o imprudente que o descartou. Vou ser feliz por ser humano, por sentir. Por ser orgânico, são e racional e ainda assim, sentir. Amando sem necessariamente ter por perto. Amar por sentir essa palavra láááá dentro. Amar por reconhecer que é sublime; que é único. Amar por reconhecer que o encontro É único! Que as pessoas são raras, são milhares... e raras. E merecem. Amar por, puta que pariu!, quem foi que disse que era assim? Eu não projeto, eu amo. Eu não atento, nem almejo. Eu não peço, nem suplico,
sem pranto, nem desespero; nem me dói, só cura; eu não anseio, nem saúdo, só amo.


"Eu te amo. Mesmo negando. Mesmo deixando você ir. Mesmo não te pedindo pra ficar. Mesmo não olhando mais nos teus olhos. Mesmo não ouvindo a tua voz. Mesmo não fazendo mais parte dos teus dias. Mesmo estando longe, eu te amo. E amo mesmo. Mesmo não sabendo (oqueé) amar."

sábado, 17 de setembro de 2011

por leveza, por ausência, por nada. nadinha.


Olá,
hoje escrevo por não ter nada a dizer. Hoje me inspiro pela ausência de criatividade e minhas ideias expiram no primeiro revirar de olhos. E meus olhos reviram freneticamente à procura silenciosa dum vazio sinistro 
e meu coração desconstrói a si 
por leveza.

Todo multifacetado, meu coração já desaguado inteiro em sangue
já pulsando em tudo quanto artéria
desata a reconstuir-se na cadência duma ventania que promete chuva,
e ali longe na cabeceira e esquecidos, meus fones de ouvido tocam sozinhos
e daqui de longe vendo soltas as notas jorrarem espaço afora,
avivo o olhar e a pulsação como que em notas tais quisesse dançar
e nelas 
inebrio.

E digo pros meus ouvidos aquietarem e deixarem a música desgrudar deles;
eles não querem e dizem
caso pare de soar para dentro de nós,
volta. Um dia.
E um amigo diz
leva a música na alma
e eu digo que acho graça,
e rio feito louca, feito lúdica,
mas minha boca insiste sincera e esboça um sorriso,
meio sorriso feito orgulho de ser,
feito reconhecimento de ser poesia,
pois ela bem sabe de si quando em sorriso se estica
é que a alma quando quis sair por ela
agarrou e levou corpo adentro aqueles acordes, 
feito fossem um pedaço perdido de si.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Da série As Coisas Soltas da Vida; Na cadência que só um samba...


Foi em pleno carnaval.

Sabe aquele movimento orgânico incessante feito um labirinto vivo e fluido de gente movido a música e álcool? Pois era.
Amigos há tempos, aqueles dois. Tempos medianos, não tanto de infância e não tão recentemente dos frevos de faculdade. Tempo suficiente, pois.
Compartilhavam dessas amizades leves, cômicas. Coloridas pela ordem natural das atrações.

Bem, era carnaval:
euforia etílica,
os sentidos embaralhadamente aguçados, o pudor a bailar emaranhando todas las vontades;
um tango meio sambeado para uma lascívia; um cintura prum olhar. Efusividade prum abraço (coletivo),
uma mão pruma garrafa de cachaça, pruma bunda, pra seios de plástico.
Dedos pra agarrar, cabelos para serem agarrados.
Roupas para suar, celular pra perder,
Pés para querer. E ir.
Um bigode postiço pro riso;
uma alegoria prum pretexto.

Eles se olharam no findar de um desencontro, desataram a rir cúmplices e, então, pararam:

"Como tá procê aí?"
"Tá bem", olhou pros lados, dançou um quarto de samba, fez reverência, "Eaí?"
"Tá bonito", deu com os ombros e sobrancelhas como quem dá um veredicto retórico, meio riso, "Tâmo bem, hein?"
"Bota bem..."
"É.."
Um sorriso e meio, "..."
"...", Um olhar pelas metades

Uma pausa pruma dúvida.


"..."

...

...

...

.

Um traço diagonal desalinhou olhar afora fixando as retinas de um na boca do outro, desdobrando ato tal num sorriso mútuo;

- "Cê tem uma boca de curinga", um deles soltou

E tinha mesmo.

Os olhares se fizeram baixos; lábios esquecidos entreabertos, desses que tomam pra si a finalidade inteira de expressar contemplação. O resto do corpo fazia papel de sustento. As mãos de um é que tomaram a iniciativa de tocar os lábios do outro, e assim apressaram-se a delinear, curiosas, as fendas que davam ao sorriso um alongamento horizontal de curinga; sorriso triangular de traços oblíquos, diga-se de passagem, desses elogiados desde a infância.
E, como que já não houvesse calor suficiente, a ponta dos dedos passava, agora, a roubar da pele fina e rubra dos lábios tais parte pouca da energia térmica que praticamente expulsavam; consequência direta do fluxo sanguíneo acelerado pelas firulas carnavalescas. Calor pouco porém suficiente para aumentar a curiosidade, não só das mãos mas do corpo inteiro, pelo gosto da língua ali guardada. Tanto e pacientemente adiada. A vontade.

E assim findou a espera:

Juntou os próprios lábios com aqueles que lhe prendiam os sentidos e os guiou de encontro a si como quem leva o primeiro pão-de-mel da vida ao paladar. Os beijou com uma minúcia de quem degusta pela primeira vez e sente a iminência de um medo de perder o teor suave de algum tempero sutil; a prudência diante do desconhecido; a sede e o cuidado de alguma aventura da meninice quando as curiosidades parecem emanar de tudo. Tudo. E se demorou na descoberta da primeira textura, seca. E se aventurou nos diversos ângulos que lhe eram permitidos, todos ditados ainda com muita cautela, como que ainda pedisse permissão num ato agoísta de descoberta. E a cada novo beijo, um pedido. Um demorar-se com e em si. E quando a vontade mútua transbordou em evidência, toda alegoria que os rodeava dançou invadindo-os gradativamente feito serpentina no ar, e degustaram um ao outro enquanto o carnaval fluía em cores e marchinhas.
Enquanto o carnaval fluía em algum brilho forjado, em umas e outras garrafas esquecidas no chão;
em ombros, milhares, amigos que sustentavam axilas amigas suadas de euforia. E quem disse que os ombros ligavam?
Tava tudo bêbado de suor e inebriados pelos pés que saltavam do solo salpicado de confetes e coisas soltas
numa frequência harmônica da cadência que só um samba



(de raiz)



sabe sambar.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Queria aquelas palavras elípticas encaracoladas trançando-me o ouvido até que a alma alcançassem perdidas e súplicas.



Eu olhei para aquela mulher sentada um banco a minha frente no ônibus falando no celular com seu português angolano e senti um negócio inexplicável. Instintivamente inexplicável.

Mulher negra linda de maçãs do rosto perfeitamente volumosas, de sotaque chiado, dicção fluida que me remeteu a algo circular, elíptico, algo bonito e enrolado. Enrolado como a mola formada por pequenos cachos na beira da nuca com os quais ela brincava de emaranhar os dedos; enrolava-os numa habilidade que só o hábito há de criar.
Molinhas perfeitas que lhe invadiam a borda inferior do couro cabeludo coberto de um rastafari trançado provavelmente há certo tempo. Tranças que pareciam entalhadas em mármore negro, ou feitas de fios de náilon cobertos em breu e brilho. Ela usava brincos de pérola que se destacavam num contraste incomum e continha nos lábios uma quantidade de carne e sensualidade de darem água na boca.

Não foi por pouco que invadi aquela mulher e ousei descrevê-la como fiz, a quase desculpar-me em voz alta pela natureza e profundidade com a qual a invadi em suas entranhas forjadas em pensamentos preciosamente meus. Árduos. Verossímeis pensamentos, desses que fazem a pulsação mais rápida e a respiração instintivamente mais volumosa. Pensamentos meus. Inteiramente meus; ela me pertenceu, aquela mulher. Efêmero, lapso, epifania; eu a contive.

Eis que imaginei-a beijando bocas, não necessariamente muitas, nem as contei ou incluí entre elas a minha, apesar de terem me pertencido façanhas tais. A visualizei por completo, verdade. Forjei calor, textura, todos igualmente intensos e intensamente gostosos. Sempre muito quentes. Tudo-sempre-muito-quente. A pele dela negrazul fervendo em minhas digitais em ponto de fusão, perdendo todo e qualquer traço de identidade ou juízo. Uma saliva negra adensando na minha. Uma umidade de inebriar o atrito. Lábios internos naquela cor de pele clara, degradê desaguando na branquidão óssea dos dentes. Dentes de morder, de roubar, de tirar. Dentes de rasgar.
Um cintilar azul, uma beleza que eu tragaria até ficar todo bêbado. Até doar todos os sentidos. Até doer os membros; até que me fizesse fadiga, até que me fizesse sublime. Até sublimar a visão, o tato, o gosto; até destilar o que via.
Uma beleza que eu descreveria em epopéias pra tentar guardar um tanto, um mínimo.
Que seja.
Que fosse.
Queria aquelas palavras elípticas encaracoladas trançando-me o ouvido até que a alma alcançassem perdidas e súplicas. Cheias de tesão, sexo e suor;

feito aquelas negras tranças;
carne, paixão roubada, instantânea,
souvenir, obra prima, relíquia,
feito colecionável, feito apaixonante,
melanina, beleza pura.


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Fica no mínimo no Máximo uma Noite


Pode aproximar
Pode reagir
Pode admitir
ou nem perceber

Pensei tanto em você hoje, enquanto corria. O shuffle me mandou uma música que me lembrou daqueles tempos em que eu andava confiante, segura, autoestima lá no céu, naqueles tempos em que você me rondava com alguns telefonemas, mensagens, desses romances suaves, de aparições repentinas, sem compromisso. No meu caminho rotineiro, PLAP tocava constantemente, dava alegria danada, confiança ingênua. Tempos bons. Na ida, na volta, interrompidas pelas suas buzinas, pelos teus convites de carona, alguma coisa assim, carona rápida, tão rapidinha que mal trocávamos palavras, e eu dava graças a deus por não ter tempo mesmo de trocá-las muito profundamente.

Quando ela chegar
Vai doer no olhar
Vai modificar
a luz dessa noite

Nós, sem muito compromisso, minha razão pertencia a outro, você bem desconfiava. E eu bem sentia. E mais palavras. Palavras compartilhadas, palavras trocadas, lúdicas, misteriosas, cheias de segundas intenções, trocadilhos de dar frio efêmero na barriga. Lembrei dos teus convites, dos que eu recusei, dos que calei, de tudo sobre nós que foi calado e consentido. Aliás,
acho um tanto engraçado dizer 'nós', pois, na verdade, não houve. Havia você e eu e uma vontade imensa de um grudar no outro. De descobrir e ver aquela tua expressão de gozo, aquela tua cara... E no dia seguinte seguirmos como se não havíamos sido, pois não havia nós que não fossem além das nossas pernas atadas. 
Bem verdade.

Se eu olho para o sol é pra cegar o juízo
Também não tem como fechar o olho pra você
Freiou a madrugada
é só um pouco disso tudo que eu preciso

Mas eu sabia. Quando tu lembrava de mim e me chamava pra te ajudar a escolher uma roupa, tomar um café ou pra ver o céu que era bonito de onde você morava, eu sabia que quando você me escolhia tantas vezes entre tantas outras a quem renunciava... Eu sabia. Sabia pelas suas palavras, pela forma delas. Sabia principalmente pela frequência com que elas vinham, famintas e em como demonstravam esse teu medo imenso de se entregar de novo para um outro alguém, pra não se doer, pra não se ferir, ferir teu ego gigantesco, vaidade imensa.

Não tem como evitar
Nem pronde correr
Pode recuar
ou entrar no clima

Nunca me foi tão direto assim esse teu potencial apego, mas eu soube mesmo tempos depois, tempos em que não havia mais nem resquícios de você em lugar algum. Quando tu chegou e disse bem diretamente que eu podia ter sido aquele seu alguém, eu podia ter ferido aquela tua vaidade pois você teria reagido e grudado mais em mim. Que eu poderia ter ido mais a fundo com as minhas palavras escritas, pois você se embriagaria nelas todas até me recompor inteira na essência da cada uma. Porém, eu, no embalo etílico da noite, me esqueci de lembrar qualquer coisa boa que viesse de ti. Ou de algum possível desejo. E ri. Assim, na tua cara dada a tapa, eu ri. Ri e falei que com você, jamais. Não mais...A gente era desejo puro e só.

Quando ela chegar
Vai te convencer
Que é melhor ficar
aqui essa noite

De qualquer forma, hoje eu lembrei de ti e senti vontade de te tocar com alguma frase de efeito que te traria tão rápido a mim que saciaria vontades quilométricas. Numa pressa que traduzisse uma sede imensa e então eu diria Me leva pra ver as estrelas que são tão bonitas lá de onde você mora, e teríamos um ao outro novamente e poderíamos
até beber um vinho
até o sol amanhecer 
até o dia em que uma possível lembraça acompanhada de vontade me ocorresse de novo e eu te pedisse

Fica no mínimo

Não quero fazer uso desse autoengano forjado em vaidade. Eu quero sentir o frio na minha cara dada a tapa se a brisa proveniente dos tempos vindouros, presentes ou futuros assim vier. Como que a cada bandeira se escondesse uma forma de caber no mundo. Eis aqui.

Nada é permanente. Haverá sempre algo pelo que lutar,
haverá sempre um ponto de vista alternativo.
Sempre há de haver os interesses econômicos, e as minorias,
os interesses sociais.
Tudo fluido, tudo constantemente mutável.
Sempre há de haver a revolta, o conforto.
E o conforto através da revolta. E esta contra o mesmo.

E uma ideologia por detrás de uma perspectiva,
e vice e versa.
E uma perspectiva afrente ou por entre as entranhas de uma realidade.

E milhares de pontos de vista acerca da mesma,

E um pão a se comer, e um meio de buscá-lo.
E vai sempre haver fome
e uma ideologia a ser corrompida por excesso de fome.

E uma vergonha a ser forjada por aquilo que se clamava e que de repente deixou de encher a barriga,
os olhos
e a garganta de fervor.
E o coração, sempre fatigado de tudo
sempre nessa sede de bater.

E haverá sempre uma superficialidade a ser maquiada,
uma lucidez a querer quebrá-la
e talvez um questionamento acerca da efetividade desta.

E talvez uma cegueira a ser perpetuada a troca de conforto
e a favor da continuidade
da manutenção,
do aguentar-se no mundo.
De fluir por ele, e se adaptar a ele.
E uma loucura a favor de uma existência.

Uma existência a favor de um ser, e vez ou outra uma maldade contra.
Uma sociedade a corromper
um grito a esclarecer,
uma passeata a proclamar.

Sempre um ponto de vista a ser relativo.

Sempre um ser humano
e pés e mãos
a serem metidos uns pelos outros.

E emoções a serem confundidas, e amores a serem postos
Sempre um ego;
um imensamente ego
a ser exposto
e uma sede de ser, uma sede de mostrar
uma sede de subverter;
e de ter voz
e de levantar uma bandeira.

Ou uma timidez a amenizar.

Pra tudo desatar em pó.
tudo.
Igualmente em pó.

Ainda bem que existem os monges, e os antropólogos,
e os filósofos e os físicos e os ambientalistas
os esquerdistas, os de direita, esquerda, os contemporâneos
os a favor, os que são contra
os subversivos, os conformados
os desapegados e aqueles que amam tartarugas.
ainda bem. 

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Acontece Que, essa tal felicidade?, eu já nem sei


Acontece QUE
Meus sentidos já não me cabem hoje! Não mais... e espero que nem nunca mais...
Ou espero que algum dia, ainda possam.
Ou talvez, pensando bem.. não.
De qualquer forma, espero ao menos, amanhã, poder dizer
'... e não ainda me cabem! Não me cabem, tais sentindos, ainda e não mais!
Pois desde ontem é que eles me enlouquecem numa intensidade humanamente sem fim.'

Pois o encontro me apaixona a toda vez que acontece
e me arde toda vez que se mostra volátil.. tão volátil quanto tudo;
Tão efêmero quanto nada do que eu queria.
Tão palpavelmente real quanto nada deveria ser
mas como tudo o é.
Ou, ao menos, me mostra.

Refém de nossas criações, é isso que somos.

ACONTECE QUE
você vai se perder nessa coisa que você pensa ser
e nessa ideia de felicidade que você pensa viver.
Acontece que você se dará conta que era tão precioso e tão diferente em um encontro,
e você verá que nenhum encontro é igual e que existem pessoas raras, todos nós, aliás.
Mas existem pessoas numa combinação tão peculiar de aspectos
e característica e gostos, e existem combinações tais tão incomuns...
E um encontro bonito como aquele,  também raro em toda sua completude...
não deveria, mas foi
desperdiçado a preço de Escolha.


Acontece que o alcance é relativo e ele se dá por etapas tão interligadas umas as outras
que é impossível premeditar por completo coisa qualquer.
É natural, ação e reação;
já não nos cabe, é muito maior que eu e você,
é muito maior do que a realidade em si, pois ela mesma se reinventa
e perde as rédeas de si mesma;
cria vida, pois é constituída de milhares. 
Bem como aconteceu durante anos até desaguar nos tempos atuais,
exatamente como acontece nesse exato momento até que desaguará nos momentos futuros;
Os tempos passam e as histórias feitas por grandes ou medianos homens,
desatam a acontecer e a fugir do controle.

Até que desaguará na nossa própria decepção a menos que nos demos conta
das ilusões que estamos fazendo uso pra criar as coisas todas como são...
ou continuam sendo...
Bem como dos olhos que fazemos uso pra ver,
bem como dos filtros das representatividades que fazemos uso pra sentir.
Bem como o questionamento se torna vão, pois a cultura e os conceitos já estão tão impregnados
que ou renuncio ao encontro,
ou me adapto.

Acontece que o entendimento parece tão intangível diante das coisas tão aparentemente imutáveis
que nos perdemos nessa sede de ser tudo o que aparentemente devemos...

E nos perdemos nas saudades
pois desaprendemos a entender e abraçar o que existe por dentro. O que é real mas se torna invisível.
A verdadeira sede, o verdadeiro almejar...
Me esqueci o que desejo... é o que me dizem que devo desejar,
ou no fundo eu poderia realmente reinventar minhas formas de querer?
E nos parece que abraçar as possibilidades infinitas que o mundo nos apresenta
é sinônimo de juventude, liberdade, experiência e alegria.
Enquanto esquecemos das essências imutáveis que sobrevivem ao caos das criações contemporâneas, modernas
atemporais e seculares....


Eu só queria sumir do mundo de novo no escuro do seu quarto
e no calor daquilo tudo que traduzia o afeto.


Na saudade do amor
e não seria o amor o que restou de mais sublime? 
esse algo que incessantemente se faz necessário?
Porque é que foges, então? Do que é que foges, afinal?
não percebe que as relações se tornaram o caos que são diante dos tantos conceitos sobre tais?
Diante dos sensos comuns, das restrições às quais estão sujeitas? 
Nas quais nos embriagamos e confundimos
e forjamos sofrimento por uma dor que mal compreendemos?
Que forjamos pequenez diante do que realmente nos apetece?

nós é que atribuimos valores às coisas todas, e só.
Talvez meu desejo mais puro, agora,
seja esse que forjo subversivo a tudo que vejo
(e não seria isso estar vivendo, ainda assim, as coisas ainda impostas?)
Eu quero atribuir meus valores, e não lidar com os previamente postos...
e talvez aí eu encontre, mesmo que longe dos monges, essa tal completude, essa tal felicidade.


Ou não.

terça-feira, 26 de julho de 2011

de manhã, feito algo imensamente humano


Não sei que horas são. Não tenho vontade nem meios de saber, verdade. Sei que é manhã, e sábado, visto que meu corpo pesa sob meus olhos atentos. Permaneço, assim, atemporal no que tange a exatidão numérica dessa convenção relativa ao que "passa", quero dizer, ao relógio. 

Sinto sono, mas não me acabo por isso. Meu corpo não me parece derreter como frequentemente ele o faz, minhas pálpebras, distantes, rígidas, assim permanecem. É, né? "Confusa" anda sendo uma denominação recorrente para as façanhas ideológicas da minh'alma. No entanto, não me é certo se é mesmo a palavra que melhor me expressa... agora, assim. Desconheço definição mais exata, eis a verdade. Verdade maior é que desconfio de tal existência, bullshit 
definições exatas, eu, pensamento, sensação, isso não existe assim. 
Alma tola, humana, cansada  (porém nem tanto), louca (às vezes, por demais) e exaustiva (bem verdade, quando Ego). 

Ego, traição. Detesto o modo pelo qual me apego aos valores que me rondam, a forma com que me irrito diante de mim mesma absorvendo ações alheias e atribuindo-lhes valores mais ou menos importantes; atribuições desnecessárias, dor sintética, forjada, felicidade burra, ilusão - não sei até que ponto acredito de fato, não sei o limite no qual me atrevo forçar acreditar - e esta, ainda sim, ainda dor, arde. Me dói inteira. Depois me ri; me delicio e danço feito algo imensamente suave sob todas as representatividades de mundo que me são tangiveis. 

A cabeça,
a nossa cabeça faz isso com a gente.

Oi?

É só que...
É só que hoje, meus lábios, tão vermelhos...
Hoje meus lábios tão tão vermelhos e quentes estão que...
eles só queriam...
Eu só queria...
Eu,
beijo
só.
Que.
Alguém.

Alguém que os surpreendesse com tamanha vermelhidão
Quero dizer, alguém os surpreendesse com imenso beijo, surpreendido com tamanha cor...
Ou melhor! Impressionado, esse alguém, com tamanha cor
os imaginasse tão quentes...
Tão tão quentes, que quisesse beijá-los...

Quero dizer

É só que hoje, de lábios rubros e quentes,
desejo alguém que os - meus lábios, desejasse beijar.

Pra não dizer que não foi real


Foi ele quem disse primeiro:
     - Chega uma hora que toda discussão perde o sentido... perde a razão de ser e de doer.

     Estavam sentados à pequena mesa da cozinha, à meia luz, há pouco depois de meia noite; Ela assentiu com a cabeça à constatação de que, realmente, haviam perdido a razão, haviam, na verdade, perdido um ao outro na hostilidade do amor condicional que no momento se resumia apenas em cobranças num desafeto todo banhado de egoísmo e auto-proteção.
     O ar estava frio, ambos retidos em si, em suas próprias vergonhas e medos como duas cargas elétricas de sinais opostos num ambiente de condutividade quase nula; bloqueavam a si mesmos, eis a verdade. Era desanimadora a cena, mal olhavam um para o outro, estagnados, pois. Cansados. E ainda detentores de um amor imenso; amor calado no momento, bem verdade, assim tímido, doído, exausto... Ele insistia em dizer que, se não fosse Ela, não seria mais ninguém, era bem provável mesmo; Ela imaginava que se não fosse Ele, talvez fosse outro alguém. Porém, sendo Ele, era singularmente especial. E ela sentia essa singularidade talvez por que estava mais madura que nos relacionamentos anteriores, talvez pela peculiaridade, mesmo, ali clara, assim evidente, de algo muito maior que o próprio entendimento; talvez por saber e sentir como de fato ele a havia escolhido e a forma com que ela foi ficando e se encaixando naquele encontro.. O querer e a gratuidade eram evidentes. Ela sabia e sentia e, naquela noite à mesa da cozinha, ela teria certeza.
     Os olhos permaneceram baixos, de ambos, não ousavam fitar-se. As mãos é que iam de encontro a um lugar comum, aos poucos, numa interação suave, iam-se tocando e interagindo; um dedo, depois outro, e outro, e outro ... Ela fitava aquele tímido diálogo de tato e movimentos lentos de olhos paralisados, ainda baixos e úmidos, salgados e imersos em beleza; tornavam a se encher e transbordar, ainda mais salgados, úmidos e molhados, achavam lindo o vagaroso entrelaçar das mãos. Vezenquando, as mãos, apertavam-se forte como que ali quisessem fundir, depois voltavam às carícias sutis, namoravam-se como que dotadas de vida própria. A respiração ia sufocando, pouco a pouco; o fôlego se esvaía inversamente proporcional à área de contato entre pele e outra; entre dedos, apenas, avançavam às mãos, inteiras. Avançavam membros acima, antebraço, braço, ombro, nuca, cautelosamente tateando mais afundo a alma
                            Como se o calor do toque alcançasse o coração e o esquentasse, bem como as bochechas e as coxas, narizes e pés. Ele, de pálpebras atadas, entregue àquelas mãozinhas que apaziguavam-lhe a dor, deixando-as desvendar-lhe o epitélio; tentava, por pouco, conter a excitação que aqueles gestos lhe proporcionavam, por pouco, apenas, pois logo deixava-se ser, entrega plena. Sua pulsação lhe açoitava os sentidos numa freqüência tão maior que a velocidade baixa daqueles movimentos, daquelas mãos... O mundo..... parado....... o tempo, lento, e dentro de suas carapaças orgânicas tudo acontecia. Absorveram o mundo para si mesmos através de um simples gesto mútuo, era bonito e singelo, era ser humano fazendo jus à poesia inerente das emoções orgânicas.

     As mãos dela alcançaram o rosto dele, finalmente o rosto, enquanto as dele permaneciam entorpecidas: na nuca, uma. Contra a mão dela, outra. A ponta de um dos indicadores dela desvendavam-lhe os traços, desenhava seu rosto em calor seguindo o contorno dos olhos, a curva do nariz, os lábios principalmente, num ato redundante de pura contemplação. Envolveu-lhe o rosto com as mãos inteiras; palmas das mãos comprimindo as bochechas como quem dizia Deixa eu cuidar de você; e ele de olhos fechados parecia se embriagar nalguma coisa e ela filmava tudo com o olhar e era tão sutil.... Ele beijava as mãos dela como que estivessem para desaparecer para sempre; as envolvia com as próprias comprimindo-as contra as bochechas, a boca, seus beijos; as encaixava no próprio rosto como que o fizessem completo ; ele sabia, assim, de olhos ainda atados, ele sentia: não eram exatamente as mãos em si, era de onde vinham e o que diziam. E ela, de olhos ainda entorpecidos, também soube; era carinho carinho carinho por demais que mesmo que não fosse ele e fosse um outro alugém, era ainda assim carinho carinho por demais para ser qualquer um, não era, pois, acaso completo
Era encontro, e querer, um querer imenso

domingo, 10 de julho de 2011

O inferno são... os outros?

É mesmo estranha essa coisa de ser.
É mesmo bizarro corresponder a si mesmo de acordo com vontades e possíveis especulações de.... o que mesmo?
É mesmo difícil discernir tudo que se quer de tudo o que esperam, vai saber


de qualquer forma



E você vai se descabelar ao ver que os outros também te enquadram, e vai se desconcertar ao sentir a fria cobrança de terceiros sobre o que se é. E você vai lutar, num árduo embate interno entre as especulações externas e as realizações internas, sem saber em que ponto ao certo se distinguem uma da outra, sem saber ao certo em que parte da fronteira tua com o mundo é que suas ações realmente te dizem quem são, ou vice e versa. E vai se perguntar, mesmo, se em certo ponto da sua vivência algo realmente te definiu, algo realmente te restringiu a um estado de Ser um tanto quanto diferente de antes. Sabe? Fluxo eterno, mudanças constantes; nesse mar, onde realmente se esconde o ponto de inflexão? Ponto aparente que, porém, se camufla ao ser sutil. Ao ser ação. Aliás, ponto não. Pontos. É algo que acontece, e não premedita. Nas teorias sobre 'Informação' ela é assim definida: algo que aparentemente desloca seu estado cognitivo, depois de receber uma informação, teoricamente sua palheta de conhecimentos e fatos se altera. 
Você, então, vai se perguntar se isso também se aplica na gama de fatores que te definem e talvez chegue a conclusão de que realmente toda essa questão é muito difícil e.... 

Não sei o que me define ... e confesso minha presente sensação de algo fora do lugar diante disto.
Sinto meus pés numa constante transição entre polos jamais tangíveis,
corda bamba pelo mundo para então desaguar no fim das contas,
pois tudo passa,
pois tudo começa e tudo termina.
E confesso, novamente, meu desconcerto ao ser aparentemente reduzida a desilusões... Inexpectativas.
Sem saber ao certo em que ponto se é,
apenas especulando e sentindo o que se tem vontade,
do direito de ir, a liberdade de vir,
do vazio do não saber, do conforto de só se deixar ser sem pensar;
Do desconforto da dúvida,
da sede do novo, do aperto da saudade,
da dor do desapontamento, da desilusão do fracasso;
Do enquadrar das regras sociais ao alinhamento cósmico dos planetas
da inevitável descarga hormonal, da intangibilidade de tal;
De ser humano, de ser mulher ,
de ter desejo, de ser aceita, de não o ser,
de me importar, de não dar a mínima.
Da indignação do apontamento....
Não quero esse dedo apontado pra mim!
Só desejo a compreensão sutil da relatividade que me apresento;
Só desejo a compreensão sutil de cada um para consigo mesmo,
é difícil olhar pra dentro depois que se reconhece o desarranjo do lado de fora,
e é fácil contrair as sobrancelhas e acenar indignação com a cabeça diante dos outros.
Olhando pra fora de si como se a desordem interna não fosse esse caos silencioso que filtramos para parecermos sãos.


Sãos como acreditamos ser saudável.

Espelho multifacetado é que eles são, esses outros!


Distorção pura carcaça adentro.

Para então cair no esquecimento de que, internamente, a cabeça desata em nó;
que dó que dá, como que não bastasse só Ser, Ser humano soa é mesmo desafinado.